Um encontro inesperado na praça da igreja
Data: 25/8/2024
Fotografava a beleza dos prédios na Cidade Alta, o berço de Natal, onde a história da cidade começou, quando parei em frente à Igreja de Nossa Senhora da Apresentação, o primeiro templo religioso aqui erguido, ainda no início do século XVII.
Estava absorvido na contemplação, quando uma presença inesperada me despertou. Era um morador de rua, marcado pelo tempo e pela vida, com cabelos desgrenhados e um olhar profundo, que parecia carregar o peso do mundo.
No início, o susto tomou conta de mim. Sua abordagem abrupta me deixou apreensivo, mas ele não me pediu nada. Apenas ficou ali, em silêncio, por um momento que para mim pareceu uma eternidade. Então, me fez uma única pergunta, que parecia ressoar em cada canto da minha alma:
– Deus existe?
O que poderia ser uma simples pergunta se transformou em um abismo profundo de incerteza e reflexão. Com voz embargada e olhar perdido, eu fiquei ali, parado, por alguns instantes, olhando para Igreja, procurando inspiração, em busca de resposta que parecia não vir. Ele não se movia, não dizia uma palavra a mais. Apenas, me fitava, esperando pacientemente a resposta.
Suspirei profundamente, como se cada gota de ar que puxava dos pulmões fosse uma tentativa de encontrar sentido para aquela pergunta. E, então, com o coração apertado e a mente turbulenta, comecei a falar.
Não possuo uma resposta teleológica ou filosófica definitiva. A questão da existência de Deus é um dos debates mais profundos e complexos da história da humanidade. Estamos sempre à procura de um sentido último, de uma força maior que possa conferir significado à nossa existência.
Mas, para mim, Deus existe. Não consigo imaginar a vida sem acreditar Nele. A ideia de um Deus é o que nos proporciona propósito, um refúgio contra a vastidão do vazio. Não saberia viver sem crer em Deus. Sem essa fé, a vida seria um poço profundo e oco, onde a escuridão interminável ocultaria a luz, o farol da esperança.
Como disse Ariano Suassuna, “eu não conseguiria conviver com a visão amarga, dura, atormentada e sangrenta do mundo. Então, ou existe Deus, ou a vida não tem sentido nenhum. Bastaria a morte para tirar qualquer sentido da existência. (…) Para mim Deus é uma necessidade. (…) Se eu não acreditasse em Deus, seria um desesperado.”
Deus pode ser a explicação de muitas coisas, ou talvez de nada. Mas, é a fé em Deus que nos dá esperança, que nos concede força moral e nos impulsiona a seguir em frente, sem desistir da vida diante dos desafios e adversidades, acreditando em algo melhor, aqui ou em outro lugar.
A fé pode ser uma força poderosa de transformação e redenção, pessoal e social.
A forma que Deus se comunicou cada religião pode explicar, sem que com isso possa dizer qual está certa. Insano é brigar por certezas incertas.
A ausência da fé é uma solidão imensa e um triste desamparo. Nos momentos de desespero ou de dor profunda, quando não se tem fé, a quem você pode recorrer, pedir ajuda ou compartilhar suas angústias? Como destacou a escritora Raquel de Queiroz, “é muito solitário e muito triste não ter fé. Quem não tem fé é uma pessoa infeliz. Não tem aspirações”.
Olhei para o morador de rua, ainda em silêncio, e ele sorriu. Voltei a olhar para Igreja. Quando me virei novamente para o morador de rua, ele havia desaparecido. Desesperado procurei-o na Praça André de Albuquerque, de um lado para o outro, mas ele não estava mais lá. Não tive a chance de ouvi-lo ou até de me despedir dele.
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