Ser pai de filha é o maior barato
Data: 06/07/2024
Só com a notícia de ser pai, a minha perspectiva de ver a vida mudou, trazendo uma sensação de plenitude e de renovação. Quando as minhas filhas nasceram tudo ficou diferente, uma nova dimensão se abriu diante de mim.
O nascimento de um filho nos faz redescobrir o mundo. O nublado do dia some. A claridade aponta o início do amanhã. As cores ficam mais vivas e os sons mais vibrantes. As coisas e os acontecimentos passam a ser vistos de maneira mais pura, simples e essencial.
É uma revolução de sentimentos.
Tenho duas filhas, alegria dos meus dias, propósito que preenche o meu coração. Sempre me esforço para ouvi-las atentamente, sobre suas necessidades, seus interesses ou qualquer coisa que queiram compartilhar. A conversa é o norte da nossa convivência. Considero o diálogo um pilar essencial para um relacionamento profícuo e perene.
Na minha casa, estimulo o estudo e incentivo o debate. Educar não é apenas uma meta, mas um compromisso, enquanto criar memórias duradouras é a minha missão de vida.
Ser pai de filha é o maior barato. Desde pequena, ela demonstra carinho imenso, atenção genuína e disposição constante para ajudar. Essa ternura e generosidade tornam a experiência ainda mais gratificante.
Mas, há perrengues que só pai de filha passa.
Ser pai de filhas não é tarefa fácil. O universo delas é muito voltado para o feminino. Para sair, é um vestido aqui outro acolá. O cabelo tem que ser assim ou assado. Tudo é muito delicado. Em qualquer idade, a situação não muda, só os acontecimentos se alternam.
As minhas filhas quando eram crianças, só bastava a mãe se ausentar, por menor tempo que fosse, que a minha preocupação aumentava.
Uma dizia:
– Pai, ajeite meu cabelo, faça um rabo de cavalo;
E, a outra, completava:
– Escolha a minha roupa, combinando, está certo?
Sem muito jeito, eu tentava, mas nada saía direito e a contento. Porém, fazia. Quando a mãe chegava, refazia tudo.
Se tivesse que aprontar para o balé, aí a coisa complicava. Aquele coque no cabelo é para desmoralizar o pai, por mais boa vontade que se tenha.
Todavia, sem alternativa e na precisão, eu fazia aquele amontoado de cabelo: torto e desajeitado. A professora, logo percebia a arrumação, e dizia:
– Lindo coque, papai! A mamãe está viajando?
Realmente, ser pai de filha pode ser desafiador, especialmente quando se trata de suas necessidades e desejos.
Às vezes, com tarefas simples, o pai sozinho com a filha, ainda criança, passa dificuldade, como, por exemplo, no restaurante. Se a filha quiser ir ao banheiro, o que fazer? Pequena, sozinha não pode ir. No banheiro feminino, o pai não pode entrar. No masculino, não é conveniente nem apropriado.
E o que fazer? No sufoco, só resta abraçar a filha, tampar os olhos dela e correr para o sanitário masculino. É o jeito!
Mas, o brabo é mais adiante.
Aí o tempo passa, passa, e chega a adolescência, e com ela chega aquela conversa que perturba o pai de filha:
– Pai, estou de namorado.
– Como é que é? Quem é esse rapaz?
Puxa vida! Será que chegou a hora? Não é muito cedo?
Ao escutar isso, só me lembro da crônica de Antônio Maria (Conversa de Pai e Filha):
“Pai, que ouve isso da filha mocinha, pela primeira vez, sente dor muito grande. Todo sangue lhe sobe à cabeça, e o chão do mundo sob seus pés. Ele pensava, até então, que só a filha dos outros tinha namorado. A sua tem também. Um namorado presunçosamente homem, sem coração e sem ternura. Um rapazola, banal, que dominará sua filha. Que a beijará no cinema e lhe sentirá o corpo, no enleio da dança. Que lhe fará ciúmes de lágrimas e revolta;”.
Putz!
No entanto, não se pode se desesperar é só imaginar que a sua filha é igual à filha dos outros, que será beijada também. Mas, a esperança é a lei do retorno: se respeitou a filha dos outros, os outros vão respeitar a sua filha também…
Graças a Deus!
Já o pai que foi bastante danado, a maldição vai pegá-lo de jeito, como bem lembrada na música do sambista Mosquito:
“Não brinca com a filha dos outros/ Porque você pode ter filha mulher/ Deus castiga e o mal que cê faz vai voltar pra você/ A filha de alguém vai te dar uma filha/E a sua filha vai ter que crescer/Vai crescer e o mundo vai tá diferente/E malandro igual você/Nesse tempo vai ser bem mais inteligente/Você fez um pai de família de otário/ O tempo passou mas chegou tua vez/O filho de alguém vai pegar tua filha/ E vai fazer igual ao que você já fez”.
Ultrapassada essa fase, aí vem a formatura e o casamento. Menos preocupante? Não sei ainda.
As necessidades de cada filha e os desafios de cada pai podem variar. O segredo é: dialogar sempre e constantemente com a filha, ser um pai amoroso e atencioso, buscando sempre aprender e se adaptar às suas necessidades individuais.
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