O sertão: o vaqueiro e as tradições

Autor(a): Nélio Silveira Dias Júnior

Data: 19/08/2023

Em um passado próximo, fui revisitar o sertão. Agora, mais de perto e com outro olhar. E, não poderia ser diferente, me impressionei ainda mais com a beleza do local.

Com o retorno, quase trinta anos depois, o sertão era o mesmo: único e encantador. Nada havia mudado. As paisagens repletas de caatinga: a macambira, a jurema-preta, a coroa de frade; os rios secos; as elevações rochosas; a simpatia do povo; a culinária típica.

O pôr do sol no sertão é uma imagem poética fascinante, em que o céu é pintado com cores que variam entre amarelo, laranja e vermelho, criando uma atmosfera única, que é ao mesmo tempo suave e arrebatadora.

Mas, o que mais me chamou atenção, naquele dia, foi o costume. Esse mudou. Para melhor ? Ainda não sei.

A alimentação ainda é a mesma, porém, o local do preparo mudou. O queijo, na fazenda, não se faz mais, a manteiga do sertão rareou, a carne de sol, também. A galinha não é a mais a caipira. E a canjica e a pamonha? Hoje, são difíceis de se encontrar, feitas nas próprias propriedades rurais. Tudo se compra na venda mais próxima ou no supermercado da cidade. Talvez seja mais prático e ligeiro.

Ao cair da tarde, daquele dia, o vaqueiro avisou ao fazendeiro, e eu, de lado, escutei.

– Vou arrebanhar o gado no cercado.

Aí eu parei, ansioso, e fiquei aguardando o cavalo, com sua sela e arreio enfeitados, passar a galope, nele montado o vaqueiro com a sua tradicional roupa de couro. Esperei, também, o aboio, aquele canto vagaroso e melancólico, sem palavras, marcado por vogais.

Nada disso aconteceu.

Escutei uma zoada. De princípio, não identifiquei. Não demorou e surgiu uma moto com o vaqueiro, de calção e sandália, buzinando e tangendo o gado, fazendo o mesmo movimento de como estivesse a cavalo.

O cavalo foi substituído pela moto, o gibão pelo calção e o aboio pela buzina. Parece que tudo isso seja mais conveniente, rápido e mais barato. Parece, inclusive, que nem essa prática vai demorar, e logo vai ser substituída por drone…

Mas, confesso, que tudo isso me espantou e o coração apertou e, sem poder disfarçar, a tristeza veio.

Com a melancolia veio a lembrança. Ainda menino, não mais de oito anos, quando saíamos: eu, meu pai e o vaqueiro, todos de roupa de couro, de mata a dentro na Fazenda São Sebastião, em busca do gado perdido, para trazer para o curral.

Como recordação guardo ainda a indumentária e com nostalgia lamento o desaparecimento da tradição.

Meu pai se foi; a saudade ficou; a emoção tomou conta de mim, e não pude contê-la… e o dia acabou. Mas, o sertão, lindo e soberano, restou.

Aí me lembrei de Casimiro de Abreu: “Oh! Que saudades que tenho / Da aurora da minha vida, / Da minha infância querida / Que os anos não trazem mais!” (Meus oito anos).

Nada contra o desenvolvimento. Absolutamente. É importante para o crescimento de uma região, principalmente a Nordeste. Deve, inclusive, ser incentivado, com o uso da tecnologia de ponta. Entretanto, a cultura deve ser preservada.

O vaqueiro nordestino é um personagem histórico e icônico da cultura brasileira. Ele é um exemplo de força e de perseverança. Conhecido, também, por seu estilo de vida, suas habilidades em lidar com cavalos e gado, além de sua coragem e destreza em enfrentar obstáculos em meio à caatinga.

Para muitos, o vaqueiro nordestino é a representação máxima da resistência cultural do Nordeste brasileiro. Ele é o retrato vivo de uma tradição que remonta às épocas do Brasil colonial, quando o gado era criado solto pelos campos do sertão e os vaqueiros tinham a tarefa de controlar e conduzir os animais para os currais.

A tradição e a culinária sertaneja devem ser preservadas e, sobretudo, valorizadas. São importantes para a cultura brasileira, que podem nos ensinar muito sobre a nossa própria história e nossas raízes.

Ver cada vez mais o desenvolvimento do Nordeste é um desejo; preservar a sua cultura e a sua tradição é uma necessidade. Incentivos governamentais aos proprietários rurais, para que conserve o sertanejo no campo, por suas raízes e tradições, é a esperança.

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