José Geraldo: fé, música e profissão

Autor(a): Nélio Silveira Dias Júnior

Data: 13/04/2024

No interior de antigamente, um músico ganhava oportunidade que, às vezes, mudava seu destino, pois possibilidades em outras áreas surgiam, principalmente de estudo, e uma reviravolta na vida acontecia.

José Geraldo Moura da Fonseca nasceu em São João do Sabugi, em 1925, no sertão do Seridó, tempo em que nascer era fácil, mas sobreviver aos primeiros dias era difícil. Nessa época a mortalidade infantil era o grande desafio no Nordeste.

Os seus pais, pequenos comerciantes de tecidos naquela cidade seridoense, tiveram 17 filhos, mas só 3 vingaram. Para isso, a mãe, católica e devota de São José, rogou por eles e deu-lhes o primeiro nome José. A fé prevaleceu, e a prole vingou e cresceu.

José Geraldo, o filho do meio, iniciou os seus estudos em São João do Sabugi. Paralelo a isso e sempre querendo aprender mais, passou a tocar um instrumento de sopro: sax tenor. Seguindo aí os passos do pai, Honório Maciel da Fonseca, que também foi músico e de tudo tocava, principalmente, o sax soprano. José, não demorou e passou a compor a banda da cidade, atualmente chamada de Filarmônica Honório Maciel. Com obstinação e estudo, ali se destacou.

A partir daí tudo mudou para o menino José Geraldo. Em visita àquela cidade seridoense, o então padre Walfredo Gurgel o viu tocando e com ele se impressionou pela sua pertinácia e disciplina. Então, perguntou-lhe se gostaria de estudar no Colégio Diocesano Seridoense, que dirigia e era referência de ensino na Região. Sem pestanejar, aceitou o convite e partiu! E lá intensificou os estudos. Por gratidão com aqueles que vieram antes dele, ensinavam os mais jovens, pois “é dando que se recebe”.

A música educa e transcende as limitações sociais e econômicas, abrindo portas para os menos favorecidos alcançarem seu potencial, ainda que não prossigam nela como profissão.

Monsenhor Walfredo Gurgel (1908-1971), sacerdote católico (formado em Teologia e Filosofia em Roma), conhecido por sua disponibilidade para ajudar as pessoas, abraçou José Geraldo, já órfão de pai, e, com ele, caminhou de braços dados, patrocinando os seus estudos.

Com o apoio do Monsenhor, político do qual o Rio Grande do Norte se orgulha (deputado federal, senador, vice-governador e governador), José Geraldo concluiu seus estudos no Colégio Atheneu Norte-Riograndense e, em seguida, com a criação da Faculdade de Odontologia do Rio Grande do Norte, em 3/3/1947, interessou-se pelo curso e prestou o vestibular. Aprovado, passou a cursá-lo, tendo sido diplomado cirurgião-dentista na segunda turma, em 1952.

Já formado em odontologia, Monsenhor Walfredo Gurgel convocou José Geraldo para política, para ser deputado estadual. Com a sua força política, tal intento não tardaria. Todavia, declinou do convite. Não era a sua vocação. A sua missão era outra: ser dentista.

E foi, com amor e honra.

A música deu a José Geraldo oportunidades. O seu sax tenor foi a chave que lhe abriu a porta da vida.

A música oferece forma de expressão, aprendizado, disciplina, conexão com outros. A música é um meio poderoso que pode quebrar barreiras e trazer esperança para aqueles que acreditam e se esforçam para alcançar seus sonhos.

A obstinação e o amor à odontologia foram o caminho escolhido por José Geraldo, que o trilhou até aonde a sua condição física permitiu. Fez da sua profissão um sacerdócio, sendo o boticão o seu cajado, e a amizade, a sua estrela guia.

José Geraldo se orgulhava da Faculdade de Odontologia do Rio Grande do Norte. Viu a faculdade ser reconhecida pelo Governo Federal, em 1952, e incorporada à UFRN, em 1960, e, também, ser sediada no belíssimo prédio da Av. Salgado Filho, construído em 1966, projetado pelo arquiteto Moacyr Gomes. Curso considerado um dos melhores do Brasil.

Mais tarde, testemunhou o surgimento da Academia Norte-Rio-Grandense de Odontologia, fundada em 15/3/1989, da qual foi acadêmico, ocupando a Cadeira 36.

Formado dentista, voltou ao amado Seridó, terra hospitaleira e de gente boa. Em Caicó, passou a exercer a sua profissão. Dali saiu, em 1966, para Natal, onde abriu e estabeleceu o seu consultório de odontologia. Nunca esqueceu a sua origem nem de onde veio.

José Geraldo, no seu Seridó, sempre por ele lembrado e enaltecido, encontrou a sua esposa, Alice Medeiros Fonseca, mãe de seus três filhos, mulher de fibra forte e companheira de uma vida toda, com quem enfrentou as adversidades e compartilhou alegrias. Uma união de almas.

José Geraldo foi um profissional comprometido e dedicado aos seus pacientes, buscando sempre oferecer o melhor tratamento e cuidado dentário possível. Seu consultório sempre foi um local alegre e acolhedor, onde os pacientes eram tratados com respeito e carinho.

Mas, José Geraldo sabia que a vida não era apenas trabalho. Ele valorizava as relações pessoais e sempre teve um talento especial para cultivar amizades. Para ele, seus amigos eram como uma família, uma base sólida em meio ao turbilhão da vida.

Ao longo da vida, construiu um sólido patrimônio em forma de amizades. Ele sabia que esse era o verdadeiro tesouro que nenhum dinheiro poderia comprar. Suas amizades eram sua inspiração, sua força e seu refúgio nos momentos difíceis.

José Geraldo foi muito além de um dentista. Ele foi um exemplo de dedicação, bondade e amizade. Seu legado não se limitou apenas ao cuidado com os dentes, mas sim com as pessoas. Ele se foi, em 2021, porém não se tornou inesquecível.

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