Fraude na Partilha de Bens: Negócios Simulados por Interpostas Pessoas.

Nélio Silveira Dias Júnior

Geralmente, quando o relacionamento conjugal termina, os sentimentos nobres desaparecem e aflora a trama. Um dos parceiros passa a sumir com o patrimônio conjugal, transferindo-o para terceiros: familiares e “desconhecidos”, com o desejo de prejudicar financeiramente o outro.
A fraude à partilha de bens se apresenta de várias formas. A primeira delas é a transferência dos bens conjugais para empresa, da qual o parceiro conjugal é sócio. Essa é a mais sofisticada. Outra comum é a simulação de obrigações. Também, tem-se a tradicional: transferência de bens a terceiros ou aquisição de bens em nome de outrem.
Operação fraudulenta, com interposição de pessoa, ocorre com frequência. Mas, deve ser examinada, sob dois aspectos: um, quando a pessoa interposta for um parente; o outro, quando a pessoa interposta for um terceiro: amigo, subalterno, desconhecidos, ainda que o objetivo comum seja o mesmo: “simular negociações ou domínio de bens que deveriam integrar a partilha conjugal”.
No primeiro caso, quando utilizado o expediente da interposição de pessoas próximas, como ascendentes, descendentes e irmãos, há presunção absoluta da fraude, porque assim prescreve o parágrafo único do art. 1.802, do Código Civil, como defende Rolf Madaleno. .
Nessa situação, tratando-se das pessoas acima, a simulação por interposição resulta de presunção legal (absoluta), juris et de jure, e, como tal, dispensa prova. Se é assim, não é necessário a parte mover ação para desfazer a fraude. Apenas, deve levantar a simulação na ação de partilha de bens no Juízo de Família, que, uma vez ali declarada, dever ser mantido o bem simulado na composição do acervo conjugal ou ordenar a sua devida compensação.
No segundo caso, se a interposição ocorrer por pessoa, sem ser parente, a nulidade do negócio simulado dependerá de prova e deverá ser reconhecida em ação própria e no Juízo Cível. Mas, em se tratando de Direito de Família, a fraude poderá ser reconhecida facilmente.
No plano jurídico a fraude é sinônimo de lesão causada pela conduta desleal. No ato conjugal de quebra de unidade afetiva, no tocante à partilha dos bens, a parte mais débil do casamento precisa ser processualmente protegida pelos mecanismos legais de eliminação dos nefastos resultados de desequilíbrio econômico e financeiro na divisão do acervo comum.
A começar pela facilitação da defesa dos direitos do cônjuge menos favorecido, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, a critério do juiz, diante da peculiaridade da causa relacionada à impossibilidade ou à excessiva dificuldade de cumprir o encargo (CPC, art. 373, I, § 1º).
Também, é possível minimizar a rigidez da prova quanto à comprovação da propriedade dos bens, principalmente imóveis, que têm regramento específico (CPC, art. 406).
É de aplicar-se a teoria da aparência ao direito de propriedade.
O princípio básico dos direitos reais é a proteção da aparência. Uma situação de fato que manifesta como verdadeira uma situação jurídica inexistente pode gerar efeitos jurídicos em favor de quem confiou no estado de aparência. Em algumas situações, no conflito entre o titular aparente e o titular real, sacrifica-se o segundo.
Ainda, por se tratar de fraude e simulações, conforme defende Yussef Said Cahali, pode ser provado por indícios e circunstâncias, valorando a vida pregressa e o modo de agir do parceiro, a fim de garantir igualdade da partilha de bens, repelindo a má-fé e a ilicitude.
Identificado o instrumento legal apropriado e utilizado o mecanismo jurídico adequado para reconhecer a fraude, o Judiciário resguardará a partilha dos bens conjugais: lícita e justa.

[1] MADALENO, Rolf.  Curso de Direito de Família, 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2013, pág. 831.

[1] Rolf Madaleno, op. cit. pág. 826.

[1] ROSENVALD, Nelson.  A Propriedade Aparente no Cód Civil de 2002 –  Revista Jurídica – MP – V. 6, p. 303.

[1] CAHALI, Yussef Said. Fraude Contra Credores. São Paulo: RT, 1989, pág. 52.

Voltar