Execução de alimentos e os seus procedimentos

Por Nélio Silveira Dias Júnior

Advogado

Uma vez fixada judicialmente a pensão alimentícia, impõe-se ao alimentante o seu cumprimento integral e imediato. Nessa fase processual, não mais se admite a rediscussão acerca de sua possibilidade financeira ou da necessidade do alimentado, pois tais questões já foram devidamente apreciadas no momento da fixação dos alimentos.

Agora, resta ao devedor alimentar apenas cumpri a obrigação tal como estabelecida.

O inadimplemento produz efeitos concretos e imediatos na vida do alimentando, especialmente quando se trata de menor que depende integralmente dos alimentos para sua manutenção e sobrevivência, não possuindo qualquer possibilidade de satisfazer sozinho suas necessidades básicas.

Constatado o descumprimento da obrigação — isto é, não tendo o devedor satisfeito espontaneamente o direito reconhecido por decisão judicial — cabe ao alimentando promover o respectivo cumprimento.

Formando o título executivo judicial, nos termos do art. 515, incisos I e II, do CPC, e sendo ele certo, liquido e exigível, é cabível o cumprimento de decisão,  visando à satisfação da obrigação.

A lei processual oferece ao credor de alimentos duas vias para promover o cumprimento da sentença: a) o procedimento comum, aplicável ao cumprimento de sentença que reconhece a obrigação por quantia certa (CPC, art. 523 c/c art. 528, caput, § 1º, § 8º,  § 9º ); b) o procedimento especial, destinado ao cumprimento de sentença que reconhece a exigibilidade de obrigação de prestar alimentos mediante decretação de prisão civil (CPC, art. 528, § 3º).

No primeiro caso, busca-se a satisfação do crédito alimentar atrasado por meio da expropriação, conforme art. 528, § 8º, do CPC, seguindo-se o procedimento comum do art. 523 do mesmo diploma legal.

Assim, tratando-se de condenação em quantia certa, o cumprimento definitivo da sentença será processado a requerimento do credor, sendo o devedor intimado a pagar o débito no prazo de 15 (quinze) dias, acrescido de custas, se houver.

A ausência de pagamento voluntário nesse prazo acarreta acréscimo de multa de 10% e honorários advocatícios também de 10% (CPC, art. 523, § 1º).

Independentemente disso, é imprescindível recordar que, em observância ao princípio da efetividade da tutela jurisdicional, devem ser adotados todos os meios aptos a compelir o devedor ao cumprimento da obrigação.

Com a promulgação do Novo Código de Processo Civil, o ordenamento jurídico brasileiro passou a dispor de instrumentos mais eficazes para esse fim, ao autorizar o juiz a determinar, em qualquer modalidade de cumprimento de sentença,  “todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária (art. 139, inciso IV)”.[1]

No segundo caso, admite-se o  cumprimento de sentença pelo regime especial de prisão, com fundamento  no art. 528, do CPC.

Nessa modalidade, o juiz, a requerimento do credor, determinará a intimação pessoal do executado para que, em 3 (três) dias, pague o débito, prove que o fez ou apresente justificativa plausível para a impossibilidade de pagamento.

Vale aqui ressaltar que o âmbito da justificativa é bastante limitado, não permitindo a reabertura da discussão sobre o valor justo da pensão, restringindo apenas a plausibilidade a impedimentos momentâneos e emergenciais, como fechamentos de contas bancárias, bloqueio de dinheiro, doença grave, etc.

Por outro lado, se não houver pagamento ou se a justificativa não for aceita, além do protesto da decisão judicial, será decretada a prisão civil do devedor pelo prazo de 1 a 3 meses (CPC, art. 528, § 3º).

O débito alimentar que autoriza a prisão civil do alimentante é o que compreende até 3 prestações anteriores ao ajuizamento da execução e as que vencerem no curso do processo (CPC, art. 528, § 7º).

Por sua vez, a prisão deve ser cumprida em regime fechado, devendo o preso ficar separado dos presos comuns (CPC, art. 528, § 4º).

O devedor somente se livrará da ordem de prisão mediante o pagamento integral da parcela executada, acrescido das parcelas vincendas que se vencerem durante o curso do processo executivo (CPC, 528 § 7º). 

Trata-se de regra já consolidada pela Súmula 309 do STJ:  “O débito alimentar que autoriza a prisão civil do alimentante é o que compreende até as três prestações anteriores ao ajuizamento da execução e as que se vencerem no curso do processo.”

Também é pacífico no STJ o entendimento de que o pagamento parcial do débito alimentício não desonera o devedor da obrigação alimentar e, consequentemente, da prisão civil, permitindo-a na forma da lei.

Nesse procedimento especial, cuja celeridade constitui característica essencial, não incidem, no débito, multa e honorários advocatícios, nem se realiza aa atualização monetária dos valores executados.

Busca-se, nesse rito, execução célere e eficaz, diante da sanção drástica e severa, com vistas a preservar os direitos dos alimentandos e assegurar que a determinação judicial seja respeitada e cumprida, conforme previsto no ordenamento jurídico.

Como se disse anteriormente, o legislador disponibilizou  duas formas de se executar alimentos: expropriação e prisão. Cabe ao credor, em sua execução, optar pelo rito que melhor atenda à sua pretensão. No entanto, dependendo do caso, o credor pode ajuizar as duas ações de cumprimento de sentença em paralelo, cada uma tramitando de forma independente.

Não obstante, o STJ tem flexibilizado essa interpretação em situações específicas, admitindo a cumulação dessas técnicas executivas no mesmo processo, desde que não haja prejuízo ao devedor nem ocorra nenhum tumulto processual. (REsp 1.930.593/MG).

Na prática, não é recomendável.

A propósito, em busca da efetividade à tutela jurisdicional, uma observação é pertinente.

Os atos processuais podem ser total ou parcialmente digitais, de forma a permitir que sejam produzidos, comunicados, armazenados e validados por meio eletrônico, na forma da lei (CPC, art. 193).

As intimações realizam-se, sempre que possível, por meio eletrônico, na forma da lei (CPC,  art. 270).

Com a redação dada pela Lei nº. 14.195/2021, o Código de Processo Civil estabeleceu, em seu art. 246, que “a citação será feita preferencialmente por meio eletrônica, no prazo de até 2 dias úteis, contando da decisão que a determinar, por meio de endereços eletrônicos indicados   pelo   citando   no  banco   de   dados   do  Poder   Judiciário,   conforme regulamento do Conselho Nacional de Justiça.”

Isso significa dizer que o legislador, com as normas acima identificadas, municiou o Judiciário para que, em atenção à efetividade dos atos processuais e o novo meio da comunicação utilizado pela sociedade (WhatsApp), busque mecanismos rápidos e eficientes para o chamamento ao processo dos interessados, a fim de que o processo possa ser um instrumento eficaz da aplicação do direito.

A expressão “pessoalmente” constante do artigo 528 do CPC não significa que a intimação deve ser levada a efeito por oficial de justiça. Pode ser feita por WhatsApp ou pelo Correio, desde que seja recebido pelo executado. A intimação se diz pessoal porque se opõe àquela que é feita na pessoa do advogado no cumprimento de sentença.

Tem-se, ainda, que não é exigível o recolhimento de custas iniciais na fase de cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de prestar alimentos, por inexistir tal dever no art. 528, do CPC, assim como por ser incompatível por esse tipo de procedimento.

Se não for assim,  o caso pode ser de gratuidade da justiça, considerando que o alimentante,  com insuficiência de recursos, não tem como pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios (CPC, art. 98, caput), sem comprometer o seu sustento próprio. 

Presume-se verdadeira a alegação de insuficiência deduzida exclusivamente por pessoa natural (CPC, art. 99, § 3º).

Além do mais, em ação de alimentos, a concessão de gratuidade de justiça para criança ou adolescente não está condicionada à demonstração de insuficiência de recursos de seu representante legal, como tem reiteradamente decidido o STJ (notícia: 5/1/2024).

É indispensável ressaltar, por fim, que a demora em pagar revela desprezo pela obrigação de sustento do próprio alimentante impondo ao outro genitor o sacrifício de recursos escassos para suprir necessidades básicas.

A inércia ou o descumprimento de uma ordem judicial não pode ser tolerado, sob pena de se comprometer a credibilidade do Judiciário e a proteção dos direitos fundamentais envolvidos.


[1] MARINONI, Luiz Guilherme. Novo curso de Processo Civil: tutela dos direitos mediante procedimento comum. 2. ed. São Paulo: RT, 2016, pág. 221.

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