Entre mãe e filha: o tempo passa e o amor sempre prevaleces

Data: 22/03/2025
Estava na recepção de um consultório médico, aguardando ser atendido por ordem de chegada. Essa situação exige tempo e paciência. A sala cheia tornava inevitável escutar as conversas alheias. Com o passar das horas, a irritação aumentava e as vozes se elevavam, tornando as conversas ainda menos reservadas.
Uma dessas conversas me chamou a atenção. Era entre uma mãe, por volta dos 50 anos, e sua filha, uma jovem de pouco mais de 25.
A mãe, com expressão sisuda e um ar de decepção, dizia à filha:
— Dediquei minha vida a você. Todos os dias, levava-a à escola e às atividades extraclasses. Proporcionei bastantes momentos de lazer: levei ao parque, ao cinema, ao teatro, à praia. Diariamente, escolhia a sua própria roupa de vestir. Sempre buscando o que entendia ser melhor para você.
A filha, com voz firme, rebateu:
— Eu reconheço isso e sou muito grata, mas já sou adulta, acabei de me formar. Agora tenho minhas próprias escolhas e opiniões. Preciso viver minha vida.
Assisti àquele conflito de gerações entre mãe e filha sem conseguir definir, de imediato, quem tinha razão.
A filha cresceu e parecia pronta para trilhar seu próprio caminho, com seus desafios e aprendizados. Viver sua própria vida. Tomar decisões – certas ou erradas – e expressar suas opiniões com autonomia.
Afinal, passarinhos criam asas para voar. Aos pais, cabe oferecer aos filhos, na infância e na adolescência, educação e formação moral sólida, tendo o exemplo como seu maior aliado. Depois disso, resta-lhes apenas acompanhar, à distância, o seu voo, na esperança de que as asas sejam fortes o suficiente para sustentá-los.
Já a mãe, superprotetora, independentemente de sua instrução, não percebera que a filha havia se tornado adulta. Era uma mulher, dona de seu destino. Agora, deveria apenas observar de longe os atos da filha e, quando solicitada, aconselhar.
A mãe foi chamada para o atendimento, e a filha permaneceu na recepção. Me aproximei e disse que entendia seu ponto de vista e com ele concordava, mas pedi licença para acrescentar:
— O tempo passou, você cresceu, e com isso vieram novas ideias, desejos e caminhos. É natural que, às vezes, as diferenças apareçam e que nem sempre enxergue o mundo como sua mãe vê.
Ela me olhava em silêncio. Prossegui:
— Mas quero lembrar-lhe algo essencial: por trás de cada interferência, de cada preocupação, de cada conselho existe um amor imenso, um amor que só uma mãe pode sentir. Ela pode ter uma história diferente da sua, pode ver a vida de outra forma, mas tudo o que faz, no fundo, é por amor.
Fiz uma pausa antes de continuar:
— Amor que cuidou, que se preocupou, que sacrificou. Amor que, às vezes, mesmo sem palavras, se revela nos pequenos gestos.
Ela suspirou e não me interrompeu.
— Você pode discordar, pode seguir seus próprios caminhos – e deve fazer isso – mas nunca deixe que as diferenças falem mais alto do que o amor. Porque, no fim das contas, é isso que sempre unirá vocês.
E fui um pouco adiante:
— E um dia, ao olhar para trás, perceberá que esse amor foi, e sempre será, um dos maiores presentes que a vida lhe deu. Amor em excesso pode até incomodar, mas nunca fere; a indiferença, essa sim, machuca.
A jovem, circunspecta, não conseguiu esconder a emoção. Disfarçadamente, enxugou as lágrimas, agradeceu e se despediu de mim.
Pouco depois, a mãe saiu do consultório. Antes de entrar para minha consulta, vi quando a filha a abraçou demoradamente.
