Eloy de Souza: o jornalista que desafiou seu tempo

Autor(a): Nélio Silveira Dias Júnior

Data: 01/03/2025

Eloy Castriciano de Souza, um potiguar de essência e raiz, nasceu em Recife, em 1873. Ainda na infância mudou-se para o Rio Grande do Norte, onde seus pais fixaram residência em Macaíba – cidade onde nasceram seus outros quatro irmãos – e passaram a viver no engenho Jundiaí.

Filho do comerciante e político, chamado também de Eloy Castriciano de Souza, e de Henriqueta Leopoldina, construiu no Rio Grande do Norte uma carreira brilhante.

Desde cedo, enfrentou grandes desafios. Órfão ainda criança, passou a viver com sua avó materna, recém-enviuvada, em Recife, onde concluiu o ensino secundário. Contudo, não se deixou abater. Com dedicação incansável aos estudos, transformou as adversidades em oportunidades.

Graduado em Direito pela Faculdade de Recife, destacou-se no jornalismo não apenas pela vasta produção de artigos, mas, sobretudo, pela qualidade e contundência de sua escrita.

Como bem registrou Luís da Câmara Cascudo, Eloy de Souza era um jornalista “com vivacidade, com arrebatamento combativo. Sua memória, de precisão cristalina, trazia-lhe o pormenor, a cor, o movimento do episódio narrado.” Seu estilo inconfundível o tornou uma referência incontestável no jornalismo potiguar.

Eloy de Souza, com “uma pena conservadora, gravou seu nome em tinta de ouro em muitos jornais. Em matéria de jornal, conhecia tudo e utilizava com maestria: o editorial conciso, o artigo bem explanado, o suelto sumariado, a forma clara e eloquente da notícia” (Jurandyr Navarro).

Defensor intransigente da liberdade de imprensa, compreendia o papel essencial do jornalismo como instrumento de informação e transformação social. Para ele, a imprensa deveria ser independente, livre de amarras, e capaz de dar voz aos temas mais relevantes, especialmente nas regiões afastadas dos grandes centros, como era o caso do Nordeste do Brasil.

Eloy de Souza escrevia muito e com qualidade inigualável. Câmara Cascudo afirmou que “nenhum norte-rio-grandense terá um número de artigos superior a Eloy de Souza. Todos os assuntos, miniaturas ou panoramas, cabiam dentro dos limites vivos do artigo, lépido, sacudido, sonoro, empolgador.”

Seu talento era lendário.

Diziam que possuía a extraordinária capacidade de ditar dois ou até três editoriais simultaneamente, sobre temas distintos, sem perder a coesão e a força argumentativa. O resultado? Sempre brilhante. Testemunhas: o Advogado Raimundo Nonato Fernandes e o Governador Aluízio Alves, que, em certas oportunidades, datilografaram os textos.

Unanimemente reconhecido como o maior jornalista potiguar de todos os tempos, Eloy dirigiu os jornais A República e A Razão, além de colaborar com diversas outras publicações locais e nacionais.

Não por acaso, a Escola de Jornalismo Eloy de Souza, que funcionou em Natal, criada pelo governador Aluízio Alves, em 1962, recebeu seu nome, reconhecendo e perpetuando sua contribuição à imprensa. Em 1973, a instituição foi incorporada à UFRN.

Eloy de Souza foi muito além do jornalismo, foi o político e o autêntico defensor do Nordeste.

Ele não se limitou às redações. Usou sua inteligência, raciocínio rápido e memória prodigiosa para lutar pelo Nordeste, levando suas pautas para a política. Pelo Rio Grande do Norte, foi Deputado Estadual, Deputado Federal e Senador da República, entre 1895 e 1937.

A favor do Nordeste, utilizou também a tribuna do Congresso Nacional para denunciar, com conhecimento profundo, os problemas da região, especialmente a questão das secas. Seus pronunciamentos tão marcantes foram posteriormente transformados em livros. Apresentou projetos ambiciosos, como um “programa de obras de irrigação e o incentivo ao plantio de algodão em terras irrigadas”.

No início do século passado, antes mesmo de o termo ecologia se popularizar, já alertava para a preservação ambiental, incluindo as dunas de Natal.

Viajava pelo Brasil e pelo exterior (Europa, África), sempre em busca de conhecimento para aplicar em sua terra. Foi um dos oradores mais aplaudidos de sua época, impressionando pelo vigor e eloquência de seu discurso.

Eloy de Souza era, na verdade, “um apaixonado pelo Nordeste e, de modo muito especial, um enamorado do sertão. Como parlamentar e jornalista dedicou-se obstinadamente à análise e discussão de nossos problemas, posicionando-se, expondo, propondo projetos, advogando soluções”, resumiu o Des. Francisco das Chagas Pereira.

Eloy de Souza, “político de vanguarda intelectual”, também se sobressaiu na literatura. Irmão de Henrique Castriciano e Auta de Souza, confirmou a veia artística da família. Seu legado literário é vasto e valioso, mas injustamente esquecido. Entre suas obras estão: Alma e Poesia do Litoral do Nordeste; Costumes Locais; Vida de Pedro Velho; Um Problema Nacional; Cartas de um Desconhecido; Calvário das Secas e Cartas de um Sertanejo.

Durante um período, assinou sob o pseudônimo de Jacyntho Canella de Ferro, principalmente a produção jornalística centrada no sertão potiguar, “disfarce cuja origem é desconhecida, mas que sugere a rudeza resistente do sertanejo” (Chagas Pereira).

Seus textos repercutiam por todo o país, sendo citados por políticos e escritores de renome, como, por exemplo, José Américo de Almeida (A Bagaceira). Como reconhecimento por sua grandeza intelectual, ocupou a Cadeira 15 da Academia Norte-Rio-Grandense de Letras e foi membro do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte.

Nada o impediu de seguir em frente.

Primeiro negro a ingressar na política do Rio Grande do Norte e a conquistar diversos mandatos eletivos, superou preconceitos com inteligência, talento e trabalho incansável (Jurandyr Navarro).

Eloy de Souza faleceu em Natal, em 1959, deixando um legado inestimável. Em sua homenagem, um município, uma escola municipal e o museu da imprensa do Rio Grande do Norte receberam seu nome. Mas sua história jamais pode ser relegada ao esquecimento.

É nossa responsabilidade, na condição de cidadão potiguar, resgatar e divulgar a memória de conterrâneos que tanto fizeram pelo Rio Grande do Norte. Nomes como o de Eloy de Souza não podem ser apagados pela poeira do tempo. Cabe a nós mantê-los vivos na história.

Fontes:

– Rejane Cardoso – 400 nomes de Natal

– Luís da Câmara Cascudo – o Livro das Velhas Figuras

– Jurandyr Navarro – Os Notáveis – Rio Grande do Norte

– João Batista Machado – Resgate da Memória Política;

– Fundação José Augusto – ADECON

– Memórias: Eloy de Souza

– Tribuna do Norte, 8/12/2006

– Francisco das Chagas Pereira: Eloy de Souza

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