Discriminação mora ao lado

Autor(a): Nélio Silveira Dias Júnior

Data: 21/06/2025

Outro dia, de manhã cedo, entrei apressado no elevador social do prédio. Após descer alguns andares, a porta se abriu, e uma funcionária de um dos apartamentos, hesitante, perguntou com certo receio:

– Bom dia… posso entrar?

Surpreso, respondi de imediato:

– Claro que sim!

Descemos juntos até o térreo, e cada um seguiu seu destino. Mas aquela cena, aparentemente banal, me marcou.

Por que ela se sentiu obrigada a pedir permissão para usar o elevador social?

A resposta parece óbvia: alguém já a havia impedido antes. E, com isso, veio a indignação e, depois, a reflexão.

Será que ainda há edifícios residenciais onde funcionários – apenas por serem funcionários – são proibidos de usar o elevador social, com base em normas internas de que só proprietários e seus convidados têm direito a esse espaço?

Se isso existe – ou mesmo se é uma prática tolerada sob a forma de um “decreto silencioso” – trata-se de um ato claro de discriminação, disfarçado de etiqueta ou conveniência, mas que precisa ser confrontado.

Os elevadores sociais existem para transportar pessoas, não para segregá-las nem para classificar indivíduos com base em sua ocupação, aparência, ou classe social. Diferem dos elevadores de serviços, cuja a finalidade é o transporte de cargas, mudanças, compras, ou o atendimento a necessidades logísticas específicas, independentemente de quem os utilize ou os acompanhe.

A discriminação não se revela apenas em grandes discursos ou gestos públicos, nem em estádio de futebol, mas também nas pequenas atitudes cotidianas, muitas vezes silenciosas, mas profundamente excludentes. E essas são talvez as mais cruéis.

O mais lamentável é ver essa separação de pessoas aplicada em órgãos públicos. É inaceitável que, em pleno século XXI, alguns agentes políticos – que deveriam dar o exemplo – tenham elevadores privativos enquanto os cidadãos que os sustentam com seus impostos são relegados aos elevadores “comuns”.

Isso vale para parlamentares, ministros, e outros ocupantes de altos cargos: todos, afinal, são servidores, mais ou menos graduados, mas servidores. E se todos são agentes do Estado, que sentido faz essa distinção? Nenhum.

A discriminação – racial, sexual, econômica ou institucional – permanece uma prática hedionda. Não apenas pelas formas escancaradas que já conhecemos, mas também pelas sutis, disfarçadas de “protocolo”, que se perpetuam dentro de prédios, repartições e mentalidades.

A humildade, e não o privilégio, deveria ser o verdadeiro símbolo do poder.

Ainda que cada vez mais raros, bons exemplos existem. Alguns mostraram ao mundo que é possível exercer o poder com humanidade, sem jamais desrespeitar ou desprezar o povo.

Espera-se que todos, especialmente os detentores do poder, se deixem sensibilizar e contribuam para derrubar os muros invisíveis, até mesmo os que se escondem atrás de portas de elevadores.

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