Criança de Minas Gerais ficará com família substituta até o julgamento final sobre a adoção.

​Com base nos princípios da proteção integral e da preservação do melhor interesse da criança, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) confirmou decisão liminar e determinou que uma criança de Minas Gerais permaneça com a família substituta com a qual convive há seis anos. A guarda deverá ser mantida até o julgamento definitivo da ação de destituição do poder familiar dos pais biológicos e do pedido de adoção apresentado pela família.

A decisão da turma reverte julgamento do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) que havia determinado a entrega imediata da criança para a avó biológica.

A ação de destituição do poder familiar foi proposta pelo Ministério Público quando a criança tinha apenas dois anos, em razão da situação de abandono causada pelos pais biológicos. Durante o processo, a guarda foi deferida para a família substituta. Na sentença que destituiu os pais biológicos do poder familiar, o juiz de primeiro grau determinou ao casal de guardiões que ajuizasse a ação de adoção, o que foi feito.

Contra essa decisão, a avó biológica interpôs apelação. No julgamento do recurso, embora tenha mantido a destituição do poder familiar dos pais biológicos, o TJMG revogou a guarda provisória e ordenou a entrega da criança para a avó.

Respeito ao melhor inter​esse da criança

O relator do habeas corpus interposto pelo casal, ministro Antonio Carlos Ferreira, destacou que o exame de demandas envolvendo o interesse de crianças deve ser eleita solução que melhor se ajuste aos princípios do direito da infância e da adolescência – notadamente a proteção integral e o melhor interesse dos infantes, derivados da prioridade absoluta ditada pelo art. 227 da Constituição Federal.

Nesse sentido, o magistrado lembrou que o Estatuto da Criança e do Adolescente, em seu artigo 100, prevê que a aplicação de medidas deve privilegiar o fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários, conferindo ao menor proteção integral e prioritária, tendo em visa seu interesse superior.

Além disso, o artigo 39, parágrafo 3º, do ECA estabelece que, no procedimento de adoção, em caso de conflito entre direitos e interesses do adotando e de outras pessoas – inclusive seus pais biológicos –, devem prevalecer os direitos e os interesses do adotando.

Criação de laços familiares e de​mora na solução jurídica

Antonio Carlos Ferreira ressaltou que a situação de fato retratada nos autos demonstra que o convívio entre a criança e seus guardiões, por longo período e sob a forma de relação familiar, sedimentou o laço afetivo – consolidado, agora, como um vínculo parental.

“Esse resultado, vale dizer, mercê de evidente ineficiência do sistema protetivo estatal, pois é certo que uma criança submetida a medida acautelatória (abrigamento) no ano de 2014 deveria ter sua situação jurídica resolvida de forma definitiva em poucos meses, restando flagrante o desatendimento do comando inserto no artigo 163 do ECA“, reforçou o ministro.

Adicionalmente, o relator apontou que, pelo menos no momento inicial de ajuizamento do processo, os pareceres técnicos concluíram pela falta de condições e pelo desinteresse da avó paterna na guarda da criança.

Ao suspender em parte o acórdão do TJMG, o ministro também enfatizou que não há informação nos autos de ilícito cometido pela família provisória, tampouco de conluio entre eles e os demais participantes da ação de guarda – como o Ministério Público e o juízo da infância e juventude. Além disso, Ferreira ressaltou que o processo não envolve a chamada “adoção à brasileira”, já que o casal está regularmente inscrito no Cadastro Nacional de Adoção.

“Ademais, a solução deste writ não tem necessária repercussão sobre o julgamento do pedido de adoção formulado pelo casal guardião perante o Juízo originário. Trata-se aqui, com efeito, apenas de avaliar a legalidade da medida determinada pela autoridade coatora (alteração da guarda provisória), cotejando sua motivação com os elementos fáticos e jurídicos demonstrados nos autos por meio de provas pré-constituídas”, concluiu o ministro ao confirmar a decisão liminar e manter a criança com a família provisória.

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial. ​

4/06/2021 06:55

É possível ajuizar ação declaratória de relação avoenga mesmo que o pai falecido tenha outra filiação registral

​Os herdeiros de pai pré-morto têm legitimidade para ajuizar ação declaratória de relação avoenga caso o próprio falecido não tenha pleiteado, em vida, a investigação de sua origem paterna, sendo irrelevante o fato de ele ter sido registrado por outra pessoa que não o genitor.

Com esse entendimento, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve acórdão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul que reconheceu a legitimidade processual ativa de netos que, após o falecimento do pai, ajuizaram ação para que fosse reconhecida a relação com o suposto avô.

A classificação “pré-morto” é dada a quem faleceu antes do autor da herança, seu ascendente, e deixou descendentes que herdarão em seu lugar, conforme as regras do direito de representação previstas no Código Civil.

Na solução do caso, a Terceira Turma aplicou os mesmos fundamentos de precedente no qual a Segunda Seção estabeleceu que os netos possuem direito próprio e personalíssimo de pleitear a declaração de relação avoenga.

Ao STJ, o suposto avô alegou, entre outros pontos, que aquele precedente não se aplicaria ao caso, porque seria necessário distinguir a situação em que os ascendentes do pai pré-morto são desconhecidos – matéria enfrentada no precedente – da hipótese em que está pré-estabelecida essa relação de filiação, ainda que apenas registral.

Direito pró​prio dos netos

A relatora, ministra Nancy Andrighi, explicou que o precedente da Segunda Seção não se baseou, fundamentalmente, em considerações acerca da existência ou não de anterior paternidade registral ou socioafetiva.

Para a magistrada, a distinção pretendida pelo suposto avô é irrelevante para o deslinde da controvérsia, pois tanto na hipótese em que se desconhecem os genitores de pai pré-morto quanto na situação em que já existe paternidade registral ou socioafetiva reconhecida, é imprescindível tutelar o direito próprio dos netos de verem reconhecida sua parentalidade avoenga biológica.

“Se o direito dos filhos ao reconhecimento de sua origem biológica não é obstado pela existência de eventual paternidade registral ou socioafetiva, não há razão para se tolher o direito dos netos ao reconhecimento da relação avoenga”, afirmou.

Efeitos patrimoniais prescr​​evem

Na avaliação de Nancy Andrighi, caso prevalecesse o entendimento de que seria necessário o interesse do genitor em exercer o direito de buscar a sua paternidade biológica, para que só depois os seus filhos pudessem ter reconhecida a relação avoenga, seriam criadas, de maneira artificial e injusta, categorias de netos de primeira e de segunda classe.

“Aos primeiros, seria deferido o direito à investigação da ancestralidade biológica; aos segundos, seria imposta verdadeira limitação ao setor nuclear de suas esferas jurídicas, sede dos direitos da personalidade”, declarou.

A relatora destacou que, muito embora a pretensão decorrente do direito ao parentesco (natural ou civil) seja imprescritível, por ter como objetivo uma declaração de estado e como fundamento um direito da personalidade, não o são as pretensões patrimoniais – notadamente as sucessórias – que derivem desse direito.

Dessa forma, concluiu a magistrada, a obtenção de possíveis efeitos patrimoniais dessa declaração de estado será limitada às hipóteses em que não estiver prescrita a própria pretensão patrimonial.

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.​​

Voltar