A Lei de Improbidade Administrativa com a sua nova alteração

A Lei nº 8.429/1992 sofreu significativa alteração pela Lei nº. 14.230/2021, modificando alguns tipos caracterizadores do ato de improbidade administrativa, eliminando outros, tipificando a conduta quando praticada intencionalmente, revisando a prescrição e estabelecendo outras formas.

A Lei nº. 14.230/2021 entrou em vigor em 26/10/2021, data de sua publicação. 

A primeira discussão é a que se refere à aplicação dessa nova legislação e o seu momento.

Como o art. 1º, § 4º, da Lei nº. 8.429/1992, com a redação dada pela Lei nº. 14.230/2021, manda aplicar ao sistema de improbidade os princípios constitucionais do direito administrativo sancionador, não resta a menor dúvida de que as regras nele contidas retroagem e devem ser aplicadas aos casos em curso, ainda que a ação tenha sido proposta sob a égide da lei anterior.

Portanto, todos os princípios de direito penal são aplicáveis às ações de improbidade administrativa, em especial o princípio segundo o qual a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu (CF, art. 5º, XL).

A aplicação da retroatividade da norma mais benigna na esfera do Direito Administrativo Sancionador é uma consequência lógica do artigo 5º, XL, da Constituição Federal, que apesar de inicialmente ser endereçada para o Direito Penal, faz parte do arcabouço dos princípios constitucionais do Direito Sancionador latu sensu.[1]

Mesmo sendo focado para o Direito Penal, por se tratar de Direito Sancionador, na hipótese da improbidade Administrativa, o princípio constitucional da retroatividade da lei mais benéfica, caso da Lei nº 14.230/2021, deve ser aplicado ao campo administrativo e judicial sancionador, cenário no qual se inserem atos ímprobos, justamente porque, assim como a lei penal, a Lei de Improbidade também prevê em seu corpo estrutural um coletivo de sanções e penalidades. [2]

Dessa forma, a retroatividade da lei mais benigna se insere em princípio constitucional com aplicabilidade para todo o exercício do jus puniendi estatal, neste se inserindo a Lei de Improbidade Administrativa.[3]

Sobre o tema o Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo, através de suas Câmaras de Direito Público, já sedimentou a questão: a Lei nº. 14.230/2021 deve ser aplicada de forma retroativa [4].

Por sua vez, o Superior Tribunal de Justiça já sinalizou  ser possível a aplicação retroativa da Lei nº. 14.230/2021, quando o Ministro Og Fernandesse manifestou no  Resp nº. 1.712.153/MG, dizendo que: “A Lei nº 14.230/2021 trouxe mudanças significativas procedimentais e materiais. Entre essas alterações, o legislador destacou a natureza sancionatória da Lei de Improbidade, o que implica a aplicação das garantias correlatas, inclusive, retroação do tratamento mais favorável ao réu, como pode acontecer em relação à prescrição (…)”.

A jurisdição sancionadora deve sempre se pautar pelo garantismo judicial, aplicando às pretensões punitivas o controle de admissibilidade que resguarde de forma eficaz e permanente os direitos subjetivos do agente investigado (imputado), ao invés de apenas viabilizar o exercício da persecução pelo órgão público repressor.[5]

Ao aplicar, no sistema da improbidade administrativa, os Princípios Constitucionais do Direito Administrativo Sancionador, o legislador destacou especial atenção para: o princípio da legalidade, corporificado na tipicidade (arts. 5º, II e XXXIX, e 37, caput, da CF); os princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa (art. 5º, LIII, LIV e LV, CF); os princípios da segurança jurídica e retroatividade da lei benéfica (art. 5º, caput, XXXIX e XL, CF); o princípio da individualização da sanção (art. 5º, XLVI); e os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade (arts. 1º e 5º, LIV).[6]

Assim, as alterações mais benéficas da nova lei devem ser aplicadas aos casos em julgamento, mesmo que a ação tenha sido proposta sob o comando da lei anterior.


[1] MATTOS, Mauro Roberto Gomes. Aplicação retroativa da Lei nº 14.320/2021. Artigo: portal.collicita.com.br, em 16/11/2021.

[2] Idem, ibidem.

[3] Idem, ibidem.

[4] TJSP – AC 1000554-80.2019.8.26.0638; AC 000554-80.2019.8.26.0638; agravo de instrumento nº 2171166-37.2021.8.26.0000; Agravo de instrumento nº 2171166-37.2021.8.26.0000; agravo de instrumento 2029132-39.2021.8.26.0000.

[5] Mauro Roberto Gomes Mattos, op. cit.

[6] Idem, ibidem.

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