Guarda compartilhada: limites e sanções ao descumprimento

Por Nélio Silveira Dias Júnior

(Advogado)

A proteção da pessoa dos filhos é um dever fundamental dos pais e deve ser exercida com responsabilidade e atenção.

Com o rompimento da relação conjugal, os genitores não perdem o poder familiar em relação aos filhos. A partir desse momento, estabelece-se a modalidade de guarda –  unilateral ou compartilhada – e redefine-se a posse física dos filhos, que passa a ser exercida individualmente de forma alternada por cada um dos pais,  em períodos distintos, levando em consideração os melhores interesses do menor.

A guarda compartilhada, mais do que a posse física do filho,  representa a responsabilização conjunta e o exercício equilibrado de ambos os pais, ainda que não convivam sob o mesmo teto (CC, art. 1.583, § 1º).

No regime de guarda compartilhada, ambos os genitores possuem igual direito de acesso a todas as informações relativas à vida dos filhos, independentemente de com quem esteja fixada a residência de referência. Não há necessidade de autorização prévia do outro genitor para obtenção desses dados.

Essa prerrogativa inclui, mas não se limita a informações escolares, médicas, psicológicas e qualquer outro dado relevante ao desenvolvimento do menor. É dever legal de toda instituição, pública ou privada, prestar diretamente tais informações a ambos os pais, sob pena de sanção. O descumprimento dessa obrigação enseja a aplicação de multa, conforme previsto no artigo 1.584, § 6º, do Código Civil.

Trata-se de uma garantia legal que fortalece a corresponsabilidade parental e assegura a efetiva participação de ambos os genitores na formação e cuidado dos filhos, independentemente do vínculo conjugal entre eles.

A convivência familiar entre pais e filhos é essencial para o pleno desenvolvimento da criança e do adolescente, devendo ser exercido com responsabilidade e equilíbrio,  independentemente da existência e da intensidade dos conflitos entre os genitores.

A própria legislação de regência determina que o tempo de convívio com a prole  deve ser dividido de forma equilibrada com a mãe e com o pai, levando em consideração as condições fáticas e os melhores interesses dos filhos (CC, art. 1.583, § 2º).

Ainda no regime da guarda compartilhada, mesmo que se imponha equilíbrio na convivência com os pais, é necessário definir a base de moradia dos filhos, devendo a escolha recair sobre aquela que melhor atenda aos seus interesses  (CC, art. 1.583, § 3º), conferindo uma referência estável da moradia.

Com a separação conjugal, é comum que se instale entre os pais um estado de animosidade, levando-os a decidir mais pela emoção do que pela razão — o que é lamentável, pois uma decisão consensual sempre atende de forma mais adequada aos interesses de todos, especialmente dos filhos.

Quando, contudo, o consenso não é possível, o juiz é chamado a intervir, que se vale, em regra, da orientação técnico-profissional ou da atuação de equipe interdisciplinar, com o objetivo de promover uma divisão equilibrada do tempo de convivência entre pai e mãe, ouvido sempre o Ministério Público (art. 1.584, § 3º, do Código Civil).

Nessas hipóteses, o legislador conferiu ao magistrado poderes ampliados, permitindo-lhe, diante de motivos graves, regular a guarda de forma diversa daquela prevista na legislação, sempre em benefício dos filhos (art. 1.586 do Código Civil).

Daí a importância das decisões judiciais nessa matéria, que devem ser rigorosamente cumpridas, sendo inadmissível alegar desconhecimento ou utilizar subterfúgios para descumpri-las.

Ocorre que, por vezes, um dos genitores dificulta injustificadamente a convivência do outro com o filho, comportamento que pode configurar ato típico de alienação parental. Nesses casos, a legislação autoriza o juiz a alterar o regime de guarda de compartilhada para unilateral, mediante processo específico, conforme a gravidade da situação (Lei nº 12.318/2010, arts. 2º, parágrafo único, incisos II e III, e art. 6º, inciso V).

Importante destacar que, ainda que não configurada alienação parental em sentido técnico, atitudes que obstaculizem o contato da criança com o outro genitor não devem ser toleradas. Atento a isso, o Código Civil estabelece que a alteração não autorizada ou o descumprimento imotivado de cláusula de guarda, seja unilateral ou compartilhada, poderá acarretar a redução das prerrogativas atribuídas ao seu detentor (art. 1.584, § 4º).

É absolutamente incompatível com a guarda compartilhada a conduta de quem desrespeita decisões judiciais, rompe acordos de convivência e provoca sofrimento emocional ao outro genitor. Nesse tipo de guarda se espera, por essência, cooperação, respeito mútuo e  harmonia entre os genitores, sempre em prol do melhor interesse da prole.  Sem esses elementos, torna-se inviável o seu exercício adequado.

Por isso, deve haver responsabilização adequada. O genitor que, de forma consciente e premeditada, reteve o menor em desobediência a ordem judicial demonstrou não possuir condições de exercer a guarda de maneira cooperativa e responsável.

O Código Civil prevê sanção civil expressa para essa conduta (art. 1.584, § 4º), sendo imprescindível, nesse contexto, a restrição do período de convivência do genitor que, de maneira deliberada e arbitrária, violou o direito de convivência materna e afrontou decisão judicial.

Diante desse cenário, impõe-se, como medida proporcional e necessária, a modificação do regime de guarda compartilhada, com a consequente limitação do convívio do genitor infrator, enquanto persistirem as circunstâncias que desaconselham o compartilhamento.

Tal medida não desvirtua os princípios da guarda compartilhada, cujo objetivo primordial é assegurar o melhor interesse do menor e garantir-lhe o direito  à convivência equilibrada com ambos os pais. Não se pode invocar direitos quando há flagrante desrespeito às obrigações inerentes ao regime de guarda, pois tal conduta compromete o próprio equilíbrio e a efetividade de seu exercício.

A Justiça não pode ser instrumentalizada para legitimar comportamentos abusivos, tampouco se curvar àqueles que, desafiando a ordem legal, buscam fazer justiça com as próprias mãos, manipulando o sistema para justificar atos de descumprimento deliberado.

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