O verdadeiro amor

Autor(a): Nélio Silveira Dias Júnior

Data: 21/12/2024

Estávamos na Praia dos Lamartine, um verdadeiro paraíso em Cotovelo, eu e minha esposa, imersos na contemplação do mar, envoltos em um silêncio em que as poucas palavras trocadas se faziam por meio de olhares.

Depois de um tempo, um ruído surgiu à distância; aos poucos veio se aproximando; até que percebemos serem vozes. Era um casal de pescadores que discutia, cada vez mais alto. Enquanto permanecíamos imóveis, deslumbrados pela beleza da praia, a mulher, visivelmente agitada, rompeu a nossa tranquilidade com uma pergunta direta e inesperada:

— O que é o amor?

Quebrei o silêncio, que parecia ter durado horas, e, pausadamente, passei a responder.

O autêntico amor conjugal é assumido no amor divino (Gaudium et Spes – GS, 48).

É um amor que ultrapassa as imperfeições e limitações humanas, buscando a união plena entre pessoas, e encontrando a sua expressão mais profunda no exemplo de Maria e José.

Assim, quando falamos sobre o amor conjugal autêntico, estamos nos referindo a um amor que reflete essa comunhão perfeita. É um amor que deseja o bem do outro acima de si mesmo, que está disposto a perdoar e a se entregar plenamente ao outro.

Fiz uma breve pausa, deixando as palavras pairarem no ar. Então, voltei-me para aquela desconhecida e disse:

— Se não há perdão, não há amor.

Esse amor, quando se instala, não acaba nem diminui nunca, independentemente das circunstâncias, tampouco se renova ou recomeça; se um dia chega ao fim, é porque jamais existiu.

De resto, há paixão, várias paixões, sentimento nobre e prazeroso, duradouro ou não, mas não se confunde com o amor.

O amor é simplesmente único.

Quando há piedade para outro, é que o amor ainda não nasceu de verdade, ou já morreu de todo, e assim o coração não lhe importa vestir essa primeira camisa do afeto (Machado de Assis – Esaú e Jacó).

No verdadeiro amor não há espaço para o egoísmo ou interesse próprio. É um amor altruísta, que busca o bem-estar e a realização do outro. É um amor que se doa e se sacrifica pela felicidade do outro, sem esperar nada em troca.

Nesse instante, a mulher desconhecida franziu a testa, como quisesse dizer algo, mas permaneceu em silêncio.

Então, continuei.

O autêntico amor conjugal vai além de uma simples união entre duas pessoas; é o encontro de dois corações que desejam amar e ser amados com a mesma intensidade com que Deus ama.

É um amor que ultrapassa o tempo e o espaço, que se enraíza na eternidade e que nos conduz à verdadeira realização.

O amor é para sempre…

Ao assumirem o amor divino como referência, os casais podem encontrar a verdadeira felicidade e plenitude no amor conjugal, vivenciando a enriquecedora experiência de uma vida a dois em profunda união com Deus.

A mulher, pensativa, voltou o olhar para o horizonte. Depois, com um discreto sorriso no rosto, dirigiu-se a mim:

— Esse amor verdadeiro não é fantasioso, imaginário ou sonhador ?

— Creio que não, respondi.

— É fácil de encontrá-lo ? Insistiu ela.

— Também, não.

Prossegui.

— Às vezes, leva-se uma vida inteira para reconhecê-lo; outras, é preciso perdê-lo para compreendê-lo; e, em alguns casos, ele talvez jamais se revele.

A mulher, mergulhada em seus próprios pensamentos, ficou por um momento observando o mar, que se movia lentamente. Em seguida, despediu-se e partiu com seu companheiro, sem qualquer alarde, enquanto o som das ondas retornava, sereno e constante.

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