Na natureza, o homem não está só

Autor(a): Nélio Silveira Dias Júnior

Data: 18/03/2023

Em um sábado, que precedia o início do carnaval de 2023, acordei sem saber muito o que fazer. Parecia que outra diversão não teria senão a folia. Natal, agitada, se preparando para receber os foliões, com intensa programação carnavalesca, retomando a festança, depois da nefasta pandemia.

Decidi, então, visitar o Museu da Rampa, antiga estação de passageiros, utilizada outrora como base para receber hidroaviões. O Museu conta a passagem dos americanos em Natal, na 2ª Guerra Mundial, e da base aérea militar, Parnamirim Field, a maior construída fora do território dos Estados Unidos, fazendo daqui o Trampolim da Vitória.

As salas são bem planejadas e organizadas. A primeira tem, no centro, a miniatura do hidroavião (Boeing B314 Dixie Clipper) usado por Roosevelt, Presidente dos Estados Unido em 1943, quando aqui esteve na Conferência do Potengi, toda em azul, como fosse o céu, ouvindo-se músicas da época. A segunda retrata nas paredes os momentos importantes desse encontro de Roosevelt e Getúlio Vargas, Presidente do Brasil, selando a aliança e a participação do Brasil na 2ª Guerra Mundial, assim como a criação da FEB – Força Expedicionária Brasileira, mostrando imagens de sua chegada na Itália e a efetiva participação na guerra. A terceira, ampla, toda branca, contém, no início, dizeres de pensadores que lutaram pela paz mundial, e, no final, obras de arte do pintor potiguar Pedro Grilo, retratando Natal do século XX.

Apesar da imersão que fiz nos diferentes espaços, me deparei com o píer entrando no rio, de onde se vê o Potengi e a sua imensidão, local no qual o sol se põe sem amarras ou obstáculos, desenhando um cenário de esplendorosa beleza.

“Bem atento, o indagador solitário, entretanto, vai aos poucos descobrindo no tempo acinzentado do crepúsculo, que a noite caminha com pés de água, sobre o dorso do rio. O Potengi é transparente, caminho caminheiro, estuário, leito, vítreo tapete, espelho onde a noite-mulher vai mirando e remirando seu rosto de beleza para poder entrar, coroada de estrelas, nos amplos e altos terraços da Cidade” (Beira Rio – Newton Navarro).

Oh Rio Potengi, como as suas águas, sobre as quais o sol resplandece, aquece o nosso coração!

Fiquei ali impactado com a beleza do Potengi, como nunca o tivesse visto, “olhando pro nada e pensando em tudo”, como diz a minha filha. Aí, depois de um bom tempo parado, me deparei com uma cena que me chamou atenção.

Era uma canoa, movida a remo, com dois lugares. Em um banco estava um pescador, no outro, uma garça, branca como as nuvens que se formavam no céu naquela tarde ensolarada. Os dois muito próximos. Não pareciam estranhos nem que o acaso acontecia naquele instante. Eram parceiros, amigos, melhor dizendo, em busca do peixe.

Uma parceria bonita: o homem e a ave. Naquele momento, percebi que logo que o pescador tirou a sua canoa da terra e passou a subir o rio o seu amigo chegou. Se cumprimentaram, do seu jeito. E naquele silêncio eloquente a comunicação fluía. A garça da orla, talvez seja essa a espécie, saía em um voo rasteiro, bicava na água, indicando o peixe, e o pescador lançava sua rede. A incerteza virava certeza. Os dois saíam ganhando.

Disso, é de se tirar uma lição.

A minha, a de que para uma boa parceria de trabalho, basta um compreender o outro; e, para uma proveitosa amizade, não precisa se falar, com um simples olhar, é suficiente para entender o que o outro precisa.

A amizade é essencial e se constrói de várias formas, inclusive com os animais.

Na natureza, nunca o homem está só. Preservá-la é o caminho. Contemplá-la acalenta a alma. E com ela interagir, encontra-se a paz.

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