A procuração, instrumento do mandato, e as suas peculiaridades

Por Nélio Silveira Dias Júnior

Advogado

O mandato, resumidamente, é um contrato pelo qual uma pessoa concede poderes a outra para agir em seu nome em diversos assuntos, cujo instrumento para exercitar essa delegação é a procuração.

Diante da importância desse instrumento e de seu amplo poder de atuação, é sempre recomendável selecionar cuidadosamente um procurador responsável e de extrema confiança, que possua habilidades necessárias para lidar com as responsabilidades a ele atribuídas.

O instrumento particular deve conter a indicação do lugar onde foi passado, a qualificação de quem concede os poderes (outorgante) e daquele que os recebe (outorgado), a data e o objetivo da outorga com a designação e a extensão dos poderes conferidos (CC, art. 654, § 1º).

Todas as pessoas capazes são aptas para dar procuração mediante instrumento particular, que valerá desde que tenha a assinatura do outorgante (Código Civil, art. 654). Essa assinatura, para sua validade, não precisa necessariamente ter o reconhecimento da firma por Ofício de Notas.

Por sinal, no trato com os órgãos e entidades públicas, é dispensado o reconhecimento de firma, devendo o agente administrativo, confrontando a assinatura com aquela constante do documento de identidade do signatário, lavrar sua autenticidade no presente documento (Lei nº. 13.726/2018, art. 3º).

Não fosse isso, na era da informática e da virtualização, tem-se ainda as assinaturas eletrônicas que suprem a formalidade. Tal reconhecimento já foi feito no Código de Processo Civil, quando se refere à procuração geral para o foro (para advogado), ao estabelecer que a procuração pode ser assinada digitalmente (art. 105).

Todavia, se tratar de atos privados, o terceiro com quem o mandatório tratar poderá ainda exigir que a procuração traga a firma reconhecida (CC, art. 654, § 2º).

Quanto à sua validade, a procuração pode ser válida por um período de tempo específico ou por tempo indeterminado, até que seja revogada pelo outorgante.

Daí a preocupação de quem outorga poderes por meio de procuração. Deve ficar atento para a sua validade. Se não tiver um período delimitado, a situação é alarmante. A sua validade só termina quando for expressamente revogada, o que pode perdurar por longo tempo. Quando se trata de instrumento particular, se perde, às vezes, o controle disso. Diferente da procuração pública, que fica custodiada no Ofício de Notas, podendo ser consultada a qualquer momento.

A procuração pode ser geral, conferindo amplos poderes para agir em nome de pessoa representada, ou pode ser específica, limitando os poderes a certos assuntos ou ações determinadas.

O mandato em termos gerais só confere poderes de administração. Para alienar, hipotecar, transigir, ou praticar outros quaisquer atos que exorbitem da administração ordinária, depende a procuração de poderes especiais e expressos. O poder de transigir não importa o de firmar compromisso (CC, art. 661).

Sempre que o mandatário estipular negócios expressamente em nome do mandante, será este o único responsável; ficará, porém, o mandatário pessoalmente obrigado, se agir no seu próprio nome, ainda que o negócio seja de conta do mandante (CC, art. 663).

O outorgado, ou seja, procurador, assume a responsabilidade pelas ações tomadas em nome do outorgante.

Sendo dois ou mais os mandatários nomeados no mesmo instrumento, qualquer deles poderá exercer os poderes outorgados, se não forem expressamente declarados conjuntos, nem especificamente designados para atos diferentes, ou subordinados a atos sucessivos. Se os mandatários forem declarados conjuntos, não terá eficácia o ato praticado sem interferência de todos, salvo havendo ratificação, que retroagirá à data do ato (CC, art. 672).

O mandatário pode transferir os poderes a si outorgados a outrem, mediante o instrumento denominado de substabelecimento, documento autônomo, assinado só por ele. O substabelecimento pode ser com ou sem reserva de poderes. No primeiro caso, o procurador continua com poderes, atuando juntamente com o substabelecido. No segundo caso, a transferência é definitiva. Há renúncia do mandato.

No direito brasileiro, o substabelecimento não precisa de autorização expressa prévia na procuração. Se nada for dito, pode ser feito. Mas o mandante pode proibir o substabelecimento, na procuração, ou apenas admiti-lo para determinados fins. [1] 

A vedação para substabelecer não invalida o substabelecimento feito, mas apenas acarreta a responsabilidade pessoal do procurador pelos atos praticados pelo substabelecido.[2]

De qualquer maneira, para aqueles mais criteriosos e cautelosos, é recomendável proibir o substabelecimento, até porque, ao passar uma procuração, é conhecido o mandante; no entanto, o substabelecido é seu desconhecido.

O mandato é extinto, além da morte ou do término do prazo e conclusão do negócio, pela revogação ou pela renúncia (CC, art. 682).

O outorgante  tem o direito de revogar a procuração a qualquer momento. A revogação pode ocorrer por meio de um documento escrito, desde que notificado ao procurador e, se necessários, a terceiros afetados.

Por outro lado, o mandatário, isto é, procurador, poderá renunciar ao mandato, comunicando, para tanto, ao mandante, por qualquer meio em direito admitido.

O mandato judicial fica subordinado às normas que lhe dizem respeito, constantes da legislação processual, e, supletivamente, às estabelecidas no Código Civil (CC, art. 692).

Essas são algumas peculiaridades relacionadas à procuração. Na hora de se assinar um instrumento de mandato, é preciso prestar atenção para garantir que o documento esteja redigido corretamente de acordo com as necessidades e interesses dos outorgantes.


[1] LÔBO, Paulo. Direito Civil: Contratos. 5. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019, pág. 420

[2] Idem, Ibidem.

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