Black Out: poeta potiguar esquecido
Data: 09/09/2022
“Adeus: cinco letras que choram” (Poesia Subterrânea). Com essa frase o poeta Black Out se despediu e partiu, em 1999. Mas, sua poesia ficou aqui entalada e precisa ecoar nos cantos e recantos da cidade.
Black out, pseudônimo de Edgar Borges, nasceu em Natal, em 1961. Foi um poeta e artista visual, que aqui viveu, tendo como inspiração o seu bairro: Mãe Luíza.
A sua poesia não tomou rumo; não partiu; ficou estagnada em Mãe Luíza, sabe lá por quê! Marginalizada ? Talvez; pela condição social do poeta? Não sei. De qualquer forma é lamentável, pois a arte, de qualquer espécie, não é para ter limites nem amarras, é para percorrer livremente. O que é bom para uns pode não ser para outros. O público é quem cabe avaliá-la sem preconceitos de origem.
Black Out sobrevivia da sua arte: ora vendendo seus poemas nos bares e restaurantes, ora abrindo letreiros comercias nos muros da cidade. Só isso, sem necessidade de classificá-la, já a torna grande e deve ser respeitada.
Aqui e acolá, pela forma que se vestia e se portava, meio extravagante, era abordado por “atitude suspeita” pela polícia e levado à prisão para averiguação, o que era deplorável. Procedimento inaceitável e inconcebível. Porém, sua maior decepção talvez não tenha sido essa, a sua exclusão do meio acadêmico era seu maior sofrimento.
Mas, tropeçar não é cair.
Black Out publicou alguns poemas em jornais locais. Mais tarde, em 1981, publicou seu único livro “Duas Cabeças”, pela COOJORNAT.
Em seu livro registrou: “Andei bastante para alcançar este cálice e aqui confesso o pouco que aprendi está aqui nestas páginas cansadas e de tantas lutas, onde a cada dia procuro a finalidade de um EU”.
E deixou a seguinte lição: “persista que jamais será vencido por outras palavras”.
Em 14/12/1999, Black Out morreu. A sua morte não foi noticiada nos meios de comunicação, teve um único registro no Diário de Natal, graças ao jornalista Moisés de Lima:
“Morreu Edgar Borges, o Black Out, o poeta preto, pobre e considerado louco pela sociedade. Vivia andando pelas ruas do centro da cidade alta, carregando seus papéis e fumando seu cigarro Belmont, vestido em suas roupas exóticas. Tinha todos os atributos de um artista maldito e discriminado.”
O jornalista registrou, ainda, que “Desce cedo começou a escrever sua poesia de cunho social e político. É dele o texto de ‘Canto à Paz’, um dos mais contundentes escritos contra as ações bélicas do ser humano” (Moisés de Lina).
Eis uma pequena amostra de sua poesia:
(Eu)
Eu sou um sonho
ou talvez um pensamento
jovem que gosta da vida
Eu vim pregar a prece
atual em poesia…
sem rimas e sem fantasias
Deixe-me dividir
para todos os dias
Sou um sonhador da paz
da fome e da alegria.
E vocês são os sonhos
Um canto (meu reino)
um prazer que jamais será imitável…
“Black Out questionava todos os paradoxos de um sistema desumano. Íntimo dos mistérios profanos da cidade”.
Na sua doença: problemas psiquiátricos, que o levou à internação hospitalar por várias vezes, recebeu apoio do Padre Sabino Gentille, vigário paroquial de Nossa Senhora de Lourdes, que realizou significativo trabalho de evangelização e social no bairro de Mãe Luíza.
Salve, salve Padre Sabino!
Black Out, esse artista da terra, massacrado pelo sistema e pelo preconceito, deve ser lembrado e divulgado, para valorizar o ser humano, que não pode ter distinção de raça, sexo, cor, idade ou quaisquer outras formas, minimizando a injustiça sofrida.
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