O Clero potiguar do século passado: um privilégio

Autor(a): Nélio Silveira Dias Júnior

Data: 30/07/2022

Basicamente, a Igreja Católica organiza-se, geográfica e administrativamente, em Paróquias, Dioceses e Arquidioceses.

As Paróquias, com os padres que são seus Párocos, se reúnem em Dioceses, dirigidas pelos Bispos, que, por sua vez, são sufragâneas das Arquidioceses, cujos líderes são os Arcebispos.

No início do século passado, a Igreja potiguar se dividia apenas em Paróquias, sufragâneas da Arquidiocese de Olinda e Recife, de onde vinham as diretrizes do episcopado.

A Igreja Matriz de Nossa Senhora da Apresentação, situada em Cidade Alta em Natal, nessa época, era nossa maior referência eclesiástica local. Era a chamada “Catedral” potiguar. Hoje, Catedral Antiga.

Trata-se da primeira igreja do Rio Grande do Norte, construída em 1599, de estilo barroco, cujos primeiros traços foram atribuídos ao padre jesuíta Gaspar de Samperes. Em 1862, no local da antiga capela, foi edificada a Igreja Matriz, com a feição que hoje se encontra.

A nova Matriz deu maior significado à Igreja Católica no Rio Grande do Norte. E ela renasce aqui com a fisionomia de caridade e amor ao próximo, com o exemplo, nesse tempo, de seu mais expressivo sacerdote: Padre João Maria (1848/1905).

O seu amor incendiava o seu apostolado com a tocha ardente que conduzia no coração (Jurandyr Navarro).

Padre João Maria Cavalcanti de Brito fez da sua evangelização uma missão: ajudar os mais necessitados. Não só pregava, mas fazia. A realização era seu triunfo; o exemplo, a glória. Tudo que recebia repartia com quem precisava, da roupa ao calçado, até no chão chegou a dormir, por ter doado a sua própria rede.

Entretanto, em outras questões se envolveu e trabalhou, como na libertação dos escravos, no combate à seca e na luta contra a epidemia da varíola. A classe menos favorecida tinha sempre a sua atenção.

Quando não teve mais o que dar – deu a vida. Matou-o a grandeza da própria alma (Henrique Castriciano).

A caridade era a maior tradição católica de Natal. Resgatá-la deve ser um compromisso de todos.

Mais tarde, em 29/12/1909, a Diocese de Natal foi criada pelo Papa São Pio X, desmembrada da já então Diocese da Paraíba (1892), sufragânea da Arquidiocese de Olinda e Recife. Seu primeiro bispo foi Dom Joaquim Antônio de Almeida (1911-1915), que foi sucedido por Dom Antônio dos Santos Cabral (1918-1921).

Depois disso, foi confiada a Diocese a Dom José Pereira Alves (1922-1928), terceiro bispo de Natal.

Com a sua chegada, refloresceu a Igreja Católica local. Na educação, obteve importantes avanços. Com a palavra, emocionou e atraiu fiéis. Com pronunciamentos precisos, encantou os diocesanos, do mais simples ao mais erudito. Um autêntico orador sacro. A sua inteligência impressionava e fazia a diferença.

O Bispo José Pereira Alves foi orientador de uma elite cultural, cujo trabalho e saber iriam mudar o rumo da Igreja de Natal. E a semente por ele plantada alteou-se em árvore frondosa, dando abundantes frutos. (Jurandir Navarro).

E o seu fruto mais significativo foi Luiz Gonzaga do Monte (1905/1944), que pelas mãos do próprio Dom José Pereira Alves foi ordenado padre, em 1927. Além de dedicado e comprometido religioso, dominou, com maestria, as ciências e as letras.

Com esse sacerdote de qualidades raras, os horizontes da Igreja Católica de Natal se alargaram ainda mais: a religiosidade foi mais aprofundada, questões científicas a ela relacionadas aclaradas. O debate foi constante. Os temas inerentes à sociedade enfrentados.

Os discursos do Padre Monte, pela beleza do conteúdo, destacavam-se e acalentavam a alma. A sua erudição ia muito além da teologia, notabilizava-se na ciência, na filosofia e na literatura. Com sua inteligência privilegiada, o seu pastoreio chamava atenção.

Na sequência, a Diocese de Natal foi entregue a Dom Marcolino Esmeraldo, em 1929, o quarto e último Bispo que aqui passou, sendo o mais longevo de todos, tendo encerrado esse episcopado, em 1952. Mas, não terminou por aí.

Ainda, em 1952, foi elevada a Diocese de Natal em Arquidiocese pelo Papa Pio XII, que nomeou Dom Marcolino Arcebispo, permanecendo até a sua morte, em 1967.

Dom Marcolino Esmeraldo foi o primeiro Arcebispo de Natal e um dos mais profícuos.

Com apuro intelectual, organizou o clero potiguar com competência, considerado um excelente administrador e pastor. Tempo de forte crescimento cristão no Rio Grande do Norte. Foram criadas no Estado várias Paróquias e duas Dioceses: Mossoró (1934) e Caicó (1939), tornando-se sufragâneas de Natal.

Culto, no campo da educação, surpreendeu. Em Natal, foram criados vários colégios católicos: Nossa Senhora das Neves, Santo Antônio (Marista), Salesiano São José, Nossa Senhora de Fátima, Maria Auxiliadora e Maristela.

Nesse tempo, a educação no Estado estava em declínio, diante da transição do ensino público de alta qualidade e o particular. Com a chegada do ensino confessional aqui, a geração dos anos 70 e 80 ganhou estímulo e teve boa formação.

Com seu falecimento, foi nomeado o segundo Arcebispo de Natal: Dom Nivaldo Monte (1967/1988), que foi sucedido por Dom Alair Vilar (1988/1993).

O terceiro Arcebispo de Natal foi quem inaugurou a nova Catedral Metropolitana em 21/11/1988, tendo a construção iniciada em 1973, com capacidade para 3.000 pessoas sentadas, projeto do Arquiteto Marconi Grevi, com estilo moderno, em forma trapezoidal.

O quarto Arcebispo de Natal foi Dom Heitor de Araújo Sales (1993/2003), encerrando o episcopado do século passado, com a beatificação, em Roma, dos Mártires de Cunhaú e Uruaçu, em 5/3/2000, estímulo ao engrandecimento espiritual do Estado.

Com isso, o século passou, a saudade ficou, e a esperança não morreu…

“A igreja precisa de pessoas de ação e de cultura para enfrentar os inimigos poderosos da impiedade.”

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