Alteração do dia das eleições de 2020 e suas implicações.

Nélio Silveira Dias Júnior (Advogado)

27/07/2020

 

Em que pese não ser  favorável à alteração do dia das eleições municipais de 2020, por entender que o processo eleitoral já havia se iniciado e qualquer mudança nas suas regras não pode ocorrer até um ano antes do pleito (CF, art. 16), para se evitar beneficiar candidatos e contaminar a democracia, o Congresso Nacional, dentro das suas atribuições constitucionais, assim deliberou, modificando os prazos eleitorais, promulgando a Emenda Constitucional 107, com vigência a partir de 3 de julho de 2020.

Prazos na disputa eleitoral não são meras formalidades. Em alguns casos, como o da inelegibilidade, ou, até mesmo, o da conduta vedada, visam a assegurar a preponderância da isonomia, expressão que é do próprio princípio republicano. Sua inobservância pode vulnerar a própria legitimidade do processo eleitoral, valor consagrado no art. 14, § 9º, da CF, como defende o Supremo Tribunal Federal.

A Emenda Constitucional nº. 107, de 3/7/2020, estabeleceu que as eleições municipais previstas para outubro de 2020 realizar-se-ão em 15 de novembro, em primeiro turno, e em  29 de novembro de 2020, em segundo turno, onde houver (art. 1º).

A partir daí o processo eleitoral sofreu alteração, que merece destaque e cumprimento, para não comprometer a lisura das eleições.

As primeiras alterações tratam do início da disputa eleitoral. Ficou estabelecido que, entre 31 de agosto e 16 de setembro de 2020, serão realizadas as convenções para escolha dos candidatos pelos partidos e a deliberação sobre coligações (agora só para eleição majoritária).

Depois disso, tem-se que, até 26 de setembro de 2020, podem os partidos e coligações solicitar à Justiça Eleitoral  o registro de seus candidatos (LE, art. 11, caput, e CE, art. 93, caput) e, após essa data, a propaganda eleitoral está permitida, inclusive na internet, nos termos dos arts. 36 e 57-A da Lei nº. 9.504/97.

Salvo essas modificações, tem-se que os demais prazos fixados na Lei nº. 9.504/97 e no Código Eleitoral, que não tenham transcorrido até 3/7/2020, data da publicação da Emenda Constitucional nº 107, e tenham como referência a data do pleito serão computados considerando-se o dia 15/11/2020, a nova data das eleições municipais de 2020.

Isso significa dizer, por exemplo, que as condutas vedadas aos agentes públicos, servidores ou não, tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais, que tenham como norte o início da campanha eleitoral, o limite temporal é agora  26/9 e não mais 16/8/2020, e as outras, com baliza temporal de 3 meses antes da eleição, passam agora a ter seu limite em 15/8/ em vez de 4/7/2020.

Com relação à conduta vedada do agente público quanto à publicidade institucional dos órgãos públicos municipais e de suas entidades da administração indireta sofreu significativa mudança, uma vez que, agora, no segundo semestre de 2020, poderá ser realizada desde que seus atos e campanhas sejam destinados ao enfrentamento à pandemia da Covid-19 e à orientação da população quanto a serviços públicos e a outros temas afetados pela pandemia, resguardada a possibilidade de apuração de eventual conduta abusiva nos termos do art. 22 da Lei Complementar nº 64/90.

Essa liberalidade, vale salientar, é restrita à pandemia da Cofid-19. No que tange à publicidade institucional de outros atos, programas, obras, serviços e campanhas continua vedada, salvo em caso de grave e urgente necessidade pública, assim reconhecida pela Justiça Eleitoral (LE, art. 73, VI, “b”).

É importante ressaltar, ainda, que continua vedada a conduta de o agente público fazer pronunciamento em cadeia de rádio e televisão, fora do horário eleitoral gratuito, salvo quando, a critério da Justiça Eleitoral, tratar-se de matéria urgente, relevante e característica das funções de governo (LE, art. 73, VI, “c”).

Outra  modificação importante foi quanto aos prazos de inelegibilidade, fixados na  Lei Complementar nº 64/90.  Ficou determinado que os prazos para desincompatibilização que estiverem na  data da publicação da Emenda  Constitucional nº. 107 (3/7/2020): a) a vencer, serão computados considerando-se a  data  de  15  de  novembro,  data  das  eleições  de 2020; b) vencidos: serão considerados preclusos, vedada a sua reabertura.

Sendo assim, com exceção dos servidores públicos, estatutários ou não, que têm que se afastarem até 3 meses anteriores ao pleito, para nele concorrerem (LC 64/90, art. 1º, II, “l”), todos as demais hipóteses, cujo prazo de desincompatibilização para concorrer ao cargo de Prefeito é de 4 meses e ao cargo de Vereador é de 6 meses (LC 64/90, art. 1º, IV, “a” a “c”, e VII, ‘a” e “b”), são consideradas preclusas, ou seja, os candidatos têm que já ter se desincompatibilizado dos cargos ou funções que exercem para participarem da disputa eleitoral.

Ainda merecem ser ressaltadas alterações pontuais.

É o caso das emissoras que transmitem programa apresentado ou comentado por pré-candidato, cuja  vedação  passou a ser a partir de 11 de agosto de 2020.

E, também, as situações referentes às prestações de contas dos candidatos e dos partidos políticos, que deverão ser encaminhadas  à Justiça Eleitoral até 15 de dezembro de 2020, conforme disposto nos incisos III e IV do caput do art. 29 da Lei n°. 9.504/97, assim como o seu julgamento, quanto aos candidatos eleitos, cuja decisão deverá ser publicada até o dia 12 de fevereiro de 2021.

Finalmente, tem-se que a diplomação dos candidatos eleitos ocorrerá em todo o País até o dia 18 de dezembro.

Apesar de haver sido contornado o princípio constitucional da anualidade eleitoral, a Emenda Constitucional nº 107 enfrentou bem as alterações, vencendo a pandemia sanitária. Mas, esperamos não ter sido criada uma pandemia jurídica, pois levaria mais tempo para ser sanada.

 

 

 

 

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