Manter arma de fogo em sua residência pode ser crime.
Nélio Silveira Dias Júnior
É obrigatório o registro de arma de fogo no órgão competente (Lei 10.826/2003, art. 3º).
A arma de fogo, não sendo para uso esportivo nem de uso restrito, deve ser registrada na Polícia Federal, devendo o seu proprietário declarar a efetiva necessidade e comprovar a idoneidade (com certidões negativas de antecedentes criminais), a ocupação lícita e a residência certa, assim como a capacidade técnica e a aptidão psicológica.
Uma vez registrada a arma de fogo e expedido o respectivo certificado, terá direito o seu proprietário de possui-la, mantendo-a exclusivamente no interior de sua residência ou domicílio, ou dependência desses, ou, ainda, no seu local de trabalho, desde que seja ele o titular ou o responsável legal pelo estabelecimento ou empresa (Lei 10.826/2003, art. 5º).
Sem isso, aquele que possua ou mantenha sob sua guarda arma de fogo, acessório ou munição, de uso permitido, em sua casa ou no seu trabalho, comete o crime de posse irregular de arma de fogo, previsto no art. 12, da Lei nº 10.826/2003, com pena de detenção de 1 a 3 anos e multa.
Portar arma de fogo fora da residência ou do local de trabalho, ainda que o proprietário tenha o certificado de registro, é crime de porte ilegal de arma de fogo, previsto no art. 14 da Lei nº 10.826/2003, com pena de 2 a 4 anos, e multa.
Com relação à posse irregular de arma de fogo, tem-se que para a caracterização do crime é necessário que a arma esteja em pleno funcionamento. Se a arma estiver inutilizada, sem a menor possibilidade de efetuar disparos, não haverá crime.
Arma totalmente inapta a disparar não é arma, caracterizando-se a hipótese de crime impossível pela ineficácia absoluta do meio (art. 17, CP).[1]
Essa é a orientação do Superior Tribunal de Justiça: na hipótese que for demonstrada, por laudo pericial, a total ineficácia da arma de fogo (inapta a disparar), deve ser reconhecida a atipicidade da conduta perpetrada, diante da ausência de afetação do bem jurídico incolumidade pública, tratando-se de crime impossível pela ineficácia absoluta do meio.[2]
Nesse caso, a perícia não é uma condição de procedibilidade da ação penal, considerando que para caracterização do crime previsto no art. 12 da Lei 10.826/03, por ser de perigo abstrato e de mera conduta, e por colocar em risco a incolumidade pública, basta a prática do núcleo do tipo penal. Mas, é condição para condenação pela prática do delito.
Há quem entenda, como o penalista Fernando Capez, que se a arma for totalmente inapta a efetuar disparos será considerada obsoleta, não havendo que se falar em registro, e, por conseguinte, em violação à norma do art. 12 da Lei nº 10.826/2003.[3]
Assim, para esse penalista, a realização de prova pericial é imprescindível para aferir a potencialidade lesiva. Sem a perícia, não será tecnicamente possível saber se era ou não arma de fogo.
Por outro lado, quem tem arma de fogo em casa, sem condições de funcionamento eficaz e de evidente constatação, servindo para decorar a residência, com valor histórico e social, não tem necessidade de registrá-la, de acordo com o art. 14 do Decreto nº. 5.123/2004, em que pese o disposto no seu art. 2º, §1º, inciso V, e, por conseguinte, não comete crime.
Todavia, essa hipótese não se equipara aquele que coleciona arma de fogo (em funcionamento), mesmo que antiga, posto que, em se tratando de colecionador, é sua a obrigação de registrar a arma no Comando do Exército (Lei nº 10.826/2003, art. 24).
De qualquer forma, sendo evidente a inexistência do crime, no caso de arma considerada obsoleta, verdadeira relíquia de família, não poderá ser instaurada a persecução penal, em face da atipicidade da conduta.
[1] CAPEZ, Fernando. Estatuto do desarmamento: comentários à Lei n. 10.826/2003. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2006, pág. 71.
[2] STJ – AREsp 923.594/ES, Rel. Ministro Sebastião Reis Júnior, 6ª Turma, DJe 08/06/2017.
[3] Fernando Capez, op. cit. pág. 71
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